Capítulo 5 - Explicações


“_Podemos ser chamados de Especialistas, esse nome foi atribuído a nós pelos quatro puros, os nossos antepassados originais. Ainda não se sabe ao certo como eles obtiveram seus poderes, só sabemos que eles foram os primeiros, seus nomes e títulos: Yuseff Boncheümmer, mestre dos pulsos, o patriarca de nossa família. Giovanna Fiorentini, a manipuladora. Claude De’Goulle, o criador de portais e por fim Evelyn Grinn, a premonitora.

Mais você deve estar se perguntando o que são, e como obtemos os poderes, na verdade ainda não conseguimos descobrir como os puros obtiveram os poderes, mas sabemos que eles são provenientes de uma mutação no DNA que dá o controle a nós da porção do nosso cérebro responsável pelo sobrenatural.

Já que você não deve ter entendido muito bem, vou explicar como é o mecanismo. Quando você move o seu dedo, o seu cérebro libera um estímulo nervoso que percorre todo seu braço e contrai seu músculo, e seu dedo se move. O que nós fazemos não é nada além de controlar esses impulsos em algumas áreas de nosso corpo, nós controlamos as Sinapses. ”

_Tá bom, isso eu entendi, mas o que esses impulsos tem a ver com você fazer aparecer aquela moto, e soprar fogo pela boca? – Indagou Caliel.

_ Calma, já vou explicar isso. Primeiro eu vou explicar parte por parte. Como eu disse antes os quatro puros tinham, cada um o poder de controlar uma área dessas, e nós herdamos isso deles, mas diferente do poder puro que tinham, nós temos a liberação de partes das quatro áreas, sendo chamados de impuros, frutos da miscigenação, por isso conseguimos usar todas as técnicas, mas nosso poder nunca se igualará ao deles.

_ Quais áreas são essas?

_ Eu já ia explicar, elas são divididas em quatro, como eu havia lhe dito antes... Os pulsos, Portal, Manipulação e Premonição. Essa semana vou tentar te explicar o básico de pulsos, afinal é a técnica de nossa família. E você ainda não é liberado, mas você precisa saber o básico para a escola.

_ Escola?

_ Calma, calma... Vamos por partes, primeiro vou te introduzir o que são os pulsos e como usá-los.

Os pulsos consistem no uso de seus impulsos nervosos interagindo com o meio, isso é basicamente fazer com que os impulsos de dentro do seu corpo sejam canalizados e utilizá-los para usar o meio externo como uma parte de seu corpo. Mas para usá-los você tem que saber como o seu cérebro funciona.

Como eu disse antes, quando você quer fazer alguma ação com seu corpo primeiro você pensa nela, e dá uma “ordem” para o seu cérebro. Esta ordem é transmitida pelos seus neurônios, por intermédio das sinapses, que são justamente impulsos elétricos que polarizam e despolarizam os neurônios, enviando a “ordem” inicial para o resto de o seu corpo executá-la. Mas o surreal de tudo isso, é o fato de nós não controlarmos o “impulso” propriamente dito, pois nosso cérebro foi condicionado a fazer tudo automaticamente. – Nesse momento Kael fez uma cara afirmativa e recostou-se no sofá.

_ Então basicamente consiste em fazer com que o meio seja “parte” do seu corpo, e controlá-lo como tal, para isso existem as técnicas básicas que são as elementares: “ar, fogo, terra e ar”, e como uma espada ou uma roupa seu corpo tem maior afinidade com certo elemento, dependendo de sua índole. Eu por exemplo consigo usar bem técnicas que envolvem ar.

_ Mas como eu controlo um elemento Illik?

_ Bem, vou explicar o básico de cada um deles: Começando pela terra... O uso de técnicas que envolvem terra tem a seguinte lógica:

Você libera uma corrente de impulsos contínua, e une as palmas das mãos para direcionar e acumular os impulsos nelas. Mantendo o fluxo contínuo você entra em contato com a terra introduzindo o impulso nela, e aí por diante, de acordo com o seu alcance, você pode manipular a terra como você move um braço. Podendo amaciar ou endurecê-la, e em alguns casos mudar até sua constituição, que em casos de extremo domínio da técnica, podem ser construídas edificações completas de terra ou pedra.

_ Que impressionante! Mas a pessoa sente mesmo a terra como parte de seu corpo?

_ Sim, por isso há técnicas que criam até um boneco de terra, que sob seu controle pode se mover como uma marionete. Mas isso é outro assunto mais complexo... Por enquanto podemos já passar para os pulsos de água. – Nesse momento uma serva de cabelos castanhos claros apareceu com uma bandeja repleta de biscoitos e uma xícara de chá para ambos. Illik e Caliel agradeceram e beberam um pouco do chá antes do baixinho retomar:

_ Que chá maravilhoso... Onde eu estava mesmo?

_ Começando a explicar o elemento água...

_ Ah sim! O elemento água... Bem, o pensamento inicial é bastante similar ao da terra, aliás, é o mesmo para todos eles, afinal são todas técnicas de pulsos. O especialista emite um pulso e o acumula nas palmas das mãos, logo depois se direcionam esses pulsos para uma fonte de água próxima, trabalhando como um tipo de “trampolim”. O especialista não precisa encostar-se à água necessariamente, mas ele tem de criar uma corrente que esteja em contato com a água. Dessa vez ele não age como se a água fosse um membro de seu corpo, mas sim como se ela fosse uma arma empunhada pelo mesmo. Afinal a água trabalha de certo modo que, para servir como um ataque efetivo ela tem que ser conduzida, como uma onda. Então o movimento básico é o de “pegar” a água e conduzi-la até seu oponente, trabalhando somente como intermediário. Sacou?

_ Não muito bem, quer dizer então que eu não encosto mais estou em contato?

_ Sim, é basicamente como se você fizesse cordas de impulsos que se agarram à água.

_ Então quer dizer que invés de um só movimento se eu ficar “pegando” e jogando mais água eu vou maximizar o dano.

_ É exatamente isso, aliás, você foi até um pouco além... Mas chega de falar sobre isso hoje, o senhor deve estar exausto. Amanhã nós continuaremos.

_ Mas eu quero saber mais...

_ Calma meu senhor... Não deixarei o senhor ir despreparado para Bongor De’Grin.

_ O que é isto?

_ É a grande escola preparatória de especialistas. O período letivo começa daqui três meses. Tempo suficiente para prepará-lo com o básico.

_ Então vou confiar em você Illik. – Disse Caliel se levantando para acompanhar o serviçal que já estava ao lado da porta. Caliel deu uma ultima olhada no local, eu fechou a porta que se tramou imediatamente atrás deles, fazendo Caliel perguntar:

_ Quanto tempo se passou desde que entramos lá?

_ Bem... Agora são 21:00 hrs., você desmaiou as 15:00 hrs. Logo foram umas 6 horas senhor. – Disse o baixinho colocando novamente no bolso o relógio de mão cromado.

_ Nossa o tempo passou rápido...

_ Realmente...

_ Iremos dormir agora?

_ Se o senhor desejar sim, mas acho jogar o jantar fora é uma covardia.

_ Jantar? Nossa, eu poderia sobreviver com o almoço uma semana inteira.

_ Aqui fazemos questão de lhe servir todas as refeições.

_ Ok, eu aceito, mas com uma condição.

_ E qual seria meu senhor?

_ Eu quero primeiramente que em todas elas os servos se sentem à mesa comigo e me tratem como um amigo, e quero saber uma coisa... Aquele conjunto de casinhas que eu vi ao chegar aqui são as casas dos empregados?

_ Sim senhor, aquelas são as casas dos empregados da mansão... Mas qual o seu interesse nisso senhor? Acha que elas estão atrapalhando a passagem? Podemos relocalizá-los.

_ Não. Eu quero conversar com algum empregado que more naquele local, preciso de saber uma coisa a respeito disso.

_ Tudo bem, estamos perto do laboratório, pergunte para o Químico da mansão, o doutor Vhrooem, ele vai saber lhe informar sobre as casas. – Disse Illik virando o corredor e indo em direção a uma porta esquisita, não muito alta nem baixa, porém de difícil passagem.

O mau cheiro se agravava a cada passo em direção ao fim do corredor, que se comportava como um funil, diminuindo de dimensão de acordo com que andavam. A atmosfera foi ficando mais e mais pesada, de um modo que Caliel sentia quase um medo decrépito. Como se estivesse abrindo uma antiga tumba em um cemitério de beira de estrada.

Finalmente Illik abriu a porta, que rangeu como em um filme de terror, o salão era escuro, e tinha poucas janelas, que dificultavam a visão e a respiração. Lá dentro havia uma quantidade incrível de tubos de ensaio e vidrarias, todas com líquidos brilhantes e chamativos.

De repente uma explosão preencheu o salão de fumaça – Que fez Caliel fechar rapidamente os olhos, protegendo-os contra aquela fumaça. – e um senhor de cabelos grisalhos e escassos saiu do canto mais escuro da sala carregando um vidro com uma pequena rosa dentro dele. Seu rosto e suas roupas estavam imundos, e ele foi logo tratando de se apresentar, com uma mesura cambaleante:

_ Muito prazer, meu nome é Napoleão! – E logo depois parece que ele perdeu as forças sobre seu corpo, e se não fosse por Illik teria caído diretamente em encontro ao chão. O baixinho o pôs deitado em um canto e disse a Caliel:

_ Ele é um gênio, mas assim como algumas pessoas daqui, ele é uma pessoa de pensamentos surreais, vamos esperar que ele desperte. – E antes que Caliel pudesse responder o velho se levantou rapidamente se pronunciando:

_ Perdão, perdão senhorita rainha... Não deveria ter sido tão rude com a senhora. – Disse o doutor acariciando o rosto de Caliel, que tentou se afastar, e percebeu que os olhos dele eram vidrados, como se estivesse possuído, isso somado com a atmosfera do local fizeram um frio subir por sua espinha.

_ Doutor, este é o novo senhor de nossa casa, Caliel, ele veio fazer uma pergunta para o senhor. – Falou Illik tomando um passo á frente.

_ Ah! Passarinho verde! Quanto tempo eu não o via! Mas sim, fale com a rainha que ela pode me perguntar o que quiser, afinal eu sou apenas um de seus vassalos. – Caliel queria evitar passar mais tempo ali e tratou logo de perguntar:

_ O senhor gosta da sua casa aqui na mansão?

_ Um soldado como eu poderia dormir até em cima de um poste senhorita! – Disse o doutor pegando uma vassoura e o batendo no chão como se fosse um porta-bandeira do exército.

_ Mas se o senhor pudesse, o senhor mudaria suas moradias aqui na mansão?

_ Bem senhora rainha, eu não ligo de dormir em qualquer lugar, porém gostaria de um observatório para poder namorar algumas estrelas... mas isso é só um desejo fútil.

_ Pois que assim seja. Illik, a mansão tem dinheiro suficiente para fazer moradias do jeito que os servos querem não é? Então pergunte a todos como queriam, e digam que a casa irá bancar tudo. Vocês foram muito gentis comigo, não quero que fiquem em cabanas como aquelas.

_ O senhor realmente é igual ao seu pai... hehe. – Disse Illik com um tom de brincadeira.

_ Mas se me permite perguntar algo doutor – retomou Caliel – Eu queria saber para que o senhor está com esta rosa na mão.

_ Ahh! Aguarde e verá minha rainha... Aguarde e verá. Agora tenho que por ela em uma incubadora, se me permite rainha... – Essa foi a deixa para Illik puxar Caliel para fora, antes que se prolongassem mais as coisas. Caminharam com Caliel tomando a frente, até o salão de jantar, o qual ele lembrou o caminho com exímia maestria.

Chegando lá, ele se deparou com todos os empregados de pé como antes, e no centro da mesa um grande frango assado, uma panela repleta de arroz a La piemontês. O aroma estava muito agradável, assim que ele chegou, todos abaixaram as cabeças e disseram juntos:

_ Perdão nosso senhor! – Irritado com aquilo Kael tratou logo de repreender aquela manifestação.

_ Por que estão se desculpando? - E a única serva que permaneceu de cabeça erguida, a mesma loura que o informou mais cedo onde estava a bebida lhe respondeu:

_ Eles não se acham dignos de desfrutar e compartilhar sua presença na mesa deles, por isso estão se desculpando. Eu acho isso uma perda de tempo. – Disse ela olhando para as unhas das mãos com uma cara de indiferença, que tratou de logo ser atacada por Illik dizendo:

_ Sua insolente, abaixe a cabeça, e olhe como fala com seu senhor... – E antes que pudesse continuar atacando-a, Caliel segurou o braço em riste de Illik e disse:

_ Não! Ela está certa, eu não quero ser um estranho aqui para vocês, que isso fique bem claro. Entrei hoje neste mundo, e vocês só melhoraram minha vida. Nada mais justo que tratá-los como iguais, se não até superiores a mim, por isso esta atitude dela é o que eu quero de vocês daqui em diante, eu não quero ser bem tratado só porque lhe disseram que sou seu senhor. Nem eu mesmo sei se sou isso, por isso, quero que me tratem como um amigo, e a partir de hoje peço-lhes que acatem este meu desejo, e em todas as refeições ou algo do tipo desfrutem comigo. E por fim, nada de cordialidade, pois eu acho isso muito complicado.

E mesmo com um olhar estranho, todos acataram aquilo tudo, como se fosse uma ordem. Caliel se sentiu aliviado, pois ele sabia que não era nada daquilo, e sua consciência clamava por um refresco, e essas ações para ele aliviavam a mentira que estava sustentando. Mas afinal, era conveniente para ele tudo aquilo. Foi assim dia após dia, Caliel conseguia extinguir passo por passo a hierarquia dos Boncheümmer. Sua rotina era de acordar, tomar banho, comer seu café da manhã, acompanhar e aprender o trabalho da maioria de servos que ele pudesse. Um dia com o jardineiro, outro com o pedreiro, outro com o criador dos animais. E com o tempo pode começar a ajudá-los, e se sentia cada vez mais, a cada aprendizado, parte daquele mundo, se sentia alguém.

Todas as tardes, Illik mantinha o ritual de ensinar-lhe mais e mais sobre todas as ciências que conhecia. Mas o desejo de Caliel, o que realmente lhe interessava, Illik dizia que ia introduzi-lo aos poucos.

Passados dois meses Caliel já tinha um imenso conhecimento geral e prático, e uma promissora capacidade analítica. Começou a ler e escrever o Alemão, o Inglês e o Francês. O italiano era um problema na pronúncia, mas estava aprimorando-o. Mesmo com as dificuldades, ele era um prodígio, pois qualquer outro levaria um período de anos para aprender tudo isso.

Mas a vontade de saber mais sobre os poderes e sobre aquele admirável mundo novo era vital para ele. Adquiriu com o tempo um hábito de tratar tudo como um enigma, e queria desvendá-lo. E naquela tarde ensolarada de quarta feira ele não conseguiu mais se conter:

_ Illik, chega de história, geografia e física. Eu quero saber o resto das técnicas. Lembro-me que nós paramos nas técnicas de pulsos elementares, você tinha acabado de explicar a técnica de água. E eu analisei a fundo essas duas técnicas e queria saber se minhas análises foram corretas também.

_ Você realmente é sedento por conhecimento garoto. Assim como o seu velho. Se esse é o seu desejo, vou te explicar hoje os outros dois elementos básicos, mas se lembre de uma coisa, nada em excesso é bom, se não você aprende tudo de uma só vez, e acaba não ficando bom em nada.

_ Ok, é só que eu estou muito curioso em relação a isso tudo. Por mim eu aprenderia como usá-las logo, mas você disse que ainda não tenho os poderes liberados, e que na escola eles tratariam disso. Mas mesmo assim, estou a duas semanas aqui, e ainda me sinto um completo estranho.

_ Com o tempo você irá se acostumar e adaptar, e para ajudá-lo a isso, vou terminar de te explicar hoje as técnicas de pulsos elementares. Eu já tinha lhe explicado terra e água, então vou lhe explicar as técnicas mais complexas, o fogo e o ar.

Começando pelo fogo. Você precisa saber primeiro como funciona um processo de combustão, ou o processo de “criação do fogo”. Então o fogo, ou se você preferir a chama se trata de duas “parcelas” diferentes, há a parte visível, que é a chama por si própria, e há a liberação de calor, a combustão. Geralmente um vem junto com o outro, como conseqüência da reação, mas já que as técnicas de pulso em suma têm uma função quase unânime, a militar, o que você deve treinar é a liberação de calor. Mas agora, como fazemos isso? Em geral as técnicas de fogo seguem a linha de raciocínio: Acúmulo de impulsos nas mãos, que atuam em locais diferentes do corpo. Uma delas fica em contato com o seu peito, infiltrando impulsos para dentro de seus pulmões e os “inflando” à sua capacidade máxima. Com isso já temos um acúmulo de oxigênio suficiente para sustentar a combustão, precisando então de uma faísca para ocorrer à reação. Essa faísca é gerada por atrito, que é justamente a parte mais complexa da técnica de fogo, pois você precisa de “dividir” e manter os impulsos fazendo coisas diferentes em cada uma das mãos, e em áreas distintas do corpo.

_ Hmm... Mas como a faísca é gerada?

_ Boa percepção. Como eu disse antes, geralmente faíscas são geradas no atrito entre dois metais, porém nós temos em nosso corpo uma estrutura peculiar: as cordas vocais, e para entender as técnicas de fogo, você vai precisar saber a peculiaridade dessa estrutura.

Segundo teorias de um biólogo e físico Sueco as nossas cordas vocais vibram por um motivo incrível, dentro das cordas vocais há moléculas que se movimentam em uma velocidade tão intensa, que para haver a tensão em tais estruturas para elas não arrebentarem há uma musculatura muito potente, capaz de vibrar muito mais as nossas cordas vocais. Por isso, nós usamos exatamente essas estruturas para gerar faíscas, obrigando-as a vibrar tão intensamente que se choque com outra.

_ Mas isso não é impossível?

_ Não, bem pelo contrário, nós as usamos somente para as técnicas mais básicas, há técnicas compostas, onde você usa até os dedos da mão para gerar faíscas. Mas por hora, somente o básico nos interessa, e agora que você já sabe a teoria por trás do fogo, vou explicar o processo de uso da técnica e como alimentá-la a fim de gerar dano a outras pessoas e objetos.

Primeiramente como alimentar a chama... É necessário algum tipo de líquido ou gás inflamável, mas é complicado você andar com combustíveis para qualquer lugar que você for. Por isso há uma síntese, ou seja, seus impulsos sinápticos introduzidos nos seus pulmões assumirão uma propriedade de negatividade em relação a alguns tipos de moléculas. São exatamente essas moléculas as constituintes do combustível, então você começará a inspirar o combustível da própria atmosfera.

_ Mas na prática, terei que ficar escolhendo-as?

_ Não. Basta pronunciar o nome da técnica e conduzir o fluxo até os pulmões e inspirar que haverá a síntese automática do combustível, que será soprado, e ao passar pela região da garganta onde as cordas vocais estarão gerando faíscas, haverá a saída de fogo pela sua boca.

_ Mas isso não irá queimar a minha garganta e boca?

_ Não, pois se trata de um fluxo controlado, não há dissipação do fogo, é como se houvesse um foco, o qual o fogo é condensado e dirigido até lá. Isso faz com que o fogo aja como um cone, não queimando o seu corpo em parte alguma. Mas ao sair de sua boca o fogo se depara com um volume a ocupar bem maior, e tende a se dissipar, com isso, poderia haver um refluxo do fogo para seu próprio rosto, queimando-o. Aí está o gran finalle da técnica, a outra mão que não foi usada ainda serve como uma condutora, ou seja, você a posiciona ao lado da saída do fogo, criando uma espécie de “rede” que molda o fogo assim que ele sai de sua boca, dando a ele forma, e controle total.

_ Nossa, mas deve ser uma técnica muito difícil de ser dominada.

_ É uma técnica realmente demasiado complexa, principalmente no que se trata da sincronia das duas mãos. Eu por exemplo, demorei muito tempo para controlá-las, mas ela não é a técnica de controle mais difícil. Vou te explicar agora a lógica das técnicas de ar, começando por uma pergunta: Você percebeu alguma relação entre matéria disponível para o uso das técnicas elementares e a dificuldade de uso das mesmas?

_ Não vi relação alguma... Eu lembro que você me ensinou o uso de análise matemática, mas não consegui enxergar nenhuma co-relação de fatores.

_ Bem, é normal, aliás, você até usou esse tipo de pensamento para isso, você realmente é promissor, mas a relação é bem simples de ser percebida. Trata-se de uma proporção inversa, ou seja, quanto maior a disponibilidade de matéria para o uso da técnica, mais fácil o controle da mesma, com exceção do ar.

_ Mas eu pensei que o ar era a técnica mais fácil de controlar, por ser a matéria mais “leve”, mas parece que eu estou errado né?

_ Como eu havia lhe dito, o ar é uma exceção, pois todos os outros elementos estão em contato conosco, no caso da terra e da água, muitas vezes estamos em cima deles, mas o ponto é que há uma linha tênue que delimitam esses elementos, ou seja, se você decidir andar em cima de uma porção de terra chega um momento que haverá uma troca, entre terra por água, mas o ar não funciona bem assim. Porque nós estamos “no” ar, e não em “cima” ou “abaixo” dele, resumindo, pelo fato de ele ser homogêneo ( a atmosfera ) e não ser sólido, a manipulação de técnicas de ar envolvem um controle de impulsos minucioso, pois devido a quantidade incalculável de material disponível, toda sua energia pode se dissipar muito rapidamente.

_ Espera! Você não havia me explicado ainda sobre o gasto de energia. – Indagou Caliel curioso.

_ Calma garoto! Já vou te explicar tudo em sua respectiva hora. Mas voltando ao assunto, a técnica de ar tem um mecanismo simples, no entanto o que a torna a técnica mais difícil é exatamente o controle, que é muito minucioso. Primeiramente a união de palmas de mão, ou, agora que você já escutou várias vezes, a abertura da fenda, como dizem os especialistas mais avançados, acumulando impulsos nessa área com uma separação lenta das mãos para expandir a fenda, fazendo um tipo de “recipiente” impulsório, como se fosse uma esfera, que com controle e concentração enorme, haver a abertura de um pequeno buraco em sua superfície, visando a entrada de mais ar.

_ Não é tão difícil assim... Homenzinho rabugento – Disse Caliel com uma postura infantil.
_ Você está engano menino, pois você desconsiderou dois fatores. Primeiro qualquer perturbação rompe o recipiente, e segundo, como controlar essa porção em especial de ar no meio? Respondendo esses fatores... Basicamente trata-se de “encharcar” molécula por molécula de ar dentro do recipiente por impulsos seus, logo, o movimento pode ser aumentado, e em um instante, essa mesma porção que você controla estará a KM de distância se você quiser. Só não pode haver dissipação de impulsos, logo, quanto maior a distância, maior a sua concentração, e a chance de haver falha.

_ Ah! Realmente deve ser difícil ter esse controle, mas agora eu já sei os quatro elementos, e o uso de energia? Por favor, me explica Illik! – Disse Caliel fazendo uma cara de piedade, sendo rapidamente repreendido por Illik:

_ Não! Por hoje chega amanhã lhe explicarei sobre técnicas de portal, e até o fim da semana já terei lhe explicado sobre o gasto de energia e os danos que as técnicas causam para o corpo, pois sua aula começa já na outra semana. Por hora, tome o resto da tarde para conversar com os outros criados, já que você gosta disso. Tenho que fazer algo pelo resto do dia, até mais.

Caliel ficou parado no salão observando Illik sair pela grande porta. Ele pensou e pensou, e o que ocupava sua mente no momento eram exatamente aquelas palavras: “pois sua aula começa já na outra semana.”... Outra semana... Finalmente tinha acabado todo aquele sonho que ele havia vivido, eles iam o descobrir e ele não poderia mais retornar ali, mas ele estava crente de que faria algo para permanecer o máximo de tempo que conseguisse. O fato de tudo aquilo ser inacreditável, não o impressionava mais, pois ele havia visto o uso de técnicas com seus próprios olhos, e havia ficado claramente seduzido por aquele mundo todo.

Refletiu profundamente sobre o rumo que a vida dele tomou, de repente ele tinha uma vida, e uma vida incrível. Saiu do salão e se moveu até o jardim onde Pablo estava cuidando de um montinho de flores abaixo de uma imensa árvore, intrigado Caliel foi até lá, e se se encostou a uma cerejeira, quando Pablo disse:

_ São lindas não são? ... Eu cuido dessas camélias dia após dia, e só agora depois de quase um ano de carinho elas floresceram...

_ Mas Pablo, no outro dia eu vi você cuidando daquela Palmeira usando uma técnica, porque não usou uma para florescer essa flor também? Ela é algum tipo de flor especial?

_ Sim, ela é especial, mas não é imune ao uso de técnicas do elemento terra como você está pensando...

_ Então porque você não a floresce rápido usando alguma técnica de terra ou água como você mesmo disse?

_ Pelo mesmo motivo que eu volto para minha casa caminhando e não correndo.

_ Para não gastar energia?

_ Não meu jovem rapaz... Mas simplesmente para desfrutar dos pequenos momentos da vida. Cal, nós sabemos que você está muito empolgado com tudo isto que você está vendo aqui, mas não faça como alguns especialistas e use sempre técnicas para tudo, ação ou atividade qualquer que faça. Tudo fica tão fácil que ele vai esquecendo a graça da vida, que está no florescer desta planta por exemplo. – E ambos ficaram observando a planta pelo resto da tarde, soltando pequenos comentários espirituosos uma vez ou outra.

Jantou a noite, mas sentiu falta do baixinho, que não tinha voltado do compromisso para qual ele saiu correndo. Caliel achou estranho, pois, por mais que ele não demonstrasse, Illik tomou papel de seu primeiro amigo verdadeiro, afinal eles não deixavam de se ver um só dia.

Ele procurou o senhor Boris, o velho mordomo que agora cuidava do armazém da mansão. A noite estava nublada, e a lua banhava o céu com uma tonalidade avermelhada, era um fenômeno lindo, porém não deixava a atmosfera menos aterrorizante. Chegando no armazém Caliel percebeu a presença de alguém no telhado, com algo que se assemelhava a um bastão. Ele tinha quase se esquecido do comentário de Illik sobre o velho: “A pessoa mais sábia e excêntrica daqui”.

Com um notável esforço Caliel subiu os degraus da escada estreita que levava ao topo do galpão de tijolos escuros de fuligem, proveniente da armoaria ao lado. Já no topo ele notou que se tratava de um bastão de metal com uma pequena esfera na ponta, a qual Boris não parava de balançar nem por um segundo, levando Caliel a perguntar:

_ O que o senhor está fazendo? – Boris respondeu ofegante:

_ Uma tempestade vem se aproximando, e eu não quero perder os raios frescos.

_ Mas o que o senhor está fazendo com esse bastão?

_ Eu vou tentar pescar uns raios ariscos hoje...

_ Pescar os raios?

_ Sim! Hoje em dia raios enlatados estão caros. E o ferreiro precisa de raios naturais e saudáveis para forjar um presente para você.

_ Para mim? Mas não precisa...

_ Mas ele é muito grato por você ter salvado a filha dele do poço outro dia.

_ Aquilo não foi nada, eu só estava passando por perto e ouvi alguém chorando, e quando verifiquei, ela estava dentro do poço. Não foi nada que ninguém não faria.

_ Mesmo assim ele lhe quer fazer isso. Mas para que você veio até aqui?... Certamente não foi para escutar um velho...

_ Ah sim, eu vim até aqui pois Illik me disse uma vez que o senhor sempre sabe tudo o que acontece aqui na mansão e nas redondezas.

_ E o que o senhor quer saber?

_ Bem, é que o Illik saiu mais cedo dizendo que ia resolver um problema, mas disse que de noite ele com certeza já estaria de volta.

_ Eu sei o que Illik foi fazer. Ele passou aqui antes para pegar alguns suprimentos. Mas eu acho estranho, pois ele não deveria demorar muito, mesmo sendo um trabalho perigoso, ele já deveria ter retornado.

_ Você poderia me dizer o que ele estava fazendo?

_ Ele estava transportando um bem precioso, não posso falar o conteúdo, mas posso lhe dizer o destino: a cidade central de Wolke, no estado do vento.

_ A pessoa que receberá, é alguém importante?

_ Não é alguém a se desconsiderar... Mas não fique preocupado, amanhã ele já deve ter voltado, vá dormir em paz jovem!

_ Ah! Se é assim eu vou dormir então, mas se ele não chegar até amanhã a tarde eu voltarei. Boa noite e boa pescaria.

_ Obrigado, jajá começam a cair os danadinhos! – Logo depois Caliel desceu as escadas e foi um pouco mais calmo para a cama.

Em seu sonho ele se via em um lugar amplo, como uma planície, porém ele não via nada. Suava e gemia se remexendo na cama. Até quando finalmente se viu com sangue nas mãos, a atmosfera ao seu redor ficou mais fria e pesada, gerando uma sensação desesperadora, que acabou logo quando ele acordou ofegante.

Já era de manhã, mas não era o horário que ele costumava acordar todo dia, era bem mais cedo, então Caliel tomou um banho e saiu pela mansão à procura de Illik, mas ao passar por um dos quartos inferiores ele parou perplexo ao ver pela greta da porta de um deles aquela mesma garota que o respondera no primeiro banquete.

Ela estava de costas com uma calcinha cor azul clara, que delineava bem o volume de suas pernas, Caliel nunca havia visto algo tão bonito, suas pernas começaram a tremer, e ele sentiu seu sangue esvaecendo de seu corpo, dirigindo-se a suas virilhas. Ela estava pegando suas roupas, e foi até o canto do quarto se abaixando para pegar a saia de seu uniforme, levando Caliel a sentir-se extremamente excitado. Sua vontade era de ir ao seu encontro e agarrá-la, mas ele foi surpreendido por alguém que vinha pelo corredor, fazendo-o pular de cara no cesto de roupas sujas.

Mesmo estando imundo novamente, ele se sentia muito bem, aquela imagem não saia de sua cabeça. Ele estava com o corpo quente, e seu coração quase lhe saia pela boca de tão palpitante. De repente ele sentiu algo em seus pés, e de uma vez foi puxado com força suficiente para fazer sua cabeça rodopiar. Se encontrando estatelado no chão, ele só ouviu uma voz dizendo:

_ O que você está fazendo aí?

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